Bridge, plataforma de emissão de stablecoins pertencente à Stripe—uma das maiores empresas de infraestrutura de pagamentos online do mundo—desenvolveu a stablecoin nativa MetaMask USD (mUSD) especialmente para a MetaMask, carteira digital que ultrapassa 30 milhões de usuários de cripto.
A Bridge cuida de toda a operação de emissão, desde a custódia das reservas e auditorias de compliance até a implementação dos contratos inteligentes, enquanto a MetaMask se dedica a aprimorar a experiência do produto para o usuário final.
Essa segmentação é uma das tendências mais marcantes do universo das stablecoins: cada vez mais marcas repassam a complexa emissão de stablecoins para “fábricas OEM” especializadas, da mesma forma que a Apple delega a produção do iPhone à Foxconn.
Desde o lançamento do iPhone, a Foxconn tornou-se o principal fabricante do aparelho. Hoje, cerca de 80% dos iPhones do mundo são montados na China, e mais de 70% saem das linhas da Foxconn. No auge, o complexo de Zhengzhou da Foxconn, conhecido como “iPhone City”, chegou a empregar mais de 300 mil pessoas durante os picos de produção.
A relação entre Apple e Foxconn não se limita à terceirização; é um exemplo clássico da especialização na fabricação moderna.
A Apple concentra esforços no consumidor: design, experiência do usuário, marca e canais de venda. Produção não é diferencial para a Apple—demanda imenso investimento e alto risco. Por isso, nunca construiu fábricas, sempre confiando esse processo a parceiros altamente especializados.
Enquanto isso, a Foxconn transformou áreas vistas como “secundárias” em competências principais, criando linhas de produção do zero, gerenciando matéria-prima, processos, estoque e logística, enquanto reduz custos e mantém robustez na cadeia de suprimentos, flexibilidade produtiva e entregas pontuais. Esse padrão industrial possibilita escalabilidade sem fricção para marcas globais.
O modelo está fundamentado na divisão do trabalho. A Apple dribla custos e riscos fixos de produção, principalmente em mercados instáveis; a Foxconn aproveita a escala e diversidade de clientes para lucrar mesmo com margens unitárias baixas. As marcas ficam com a criatividade e o contato com o público; OEMs oferecem eficiência e controle de custos—um jogo de ganha-ganha.
Essa abordagem mudou setores além dos smartphones. Desde 2010, computadores, TVs, eletrodomésticos e até carros adotaram o padrão OEM. Foxconn, Quanta, Wistron e Jabil hoje são centrais na produção global. A fabricação virou modular, empacotada e escalável para clientes externos.
Anos depois, essa mesma lógica desembarca em território novo: o das stablecoins.
Emitir uma stablecoin parece simples, mas envolve muito mais: criar estruturas regulatórias, custodiar reservas bancárias, implementar contratos inteligentes seguros, garantir compatibilidade entre blockchains, integrar contas e KYC. Tudo exige capital e desenvolvimento contínuo.
Como detalhamos em “Quanto Custa Emitir uma Stablecoin?”, um emissor novo parte de investimentos de milhões de dólares—quase todos custos obrigatórios e difíceis de reduzir. Depois de lançado, o custo operacional anual pode superar dezenas de milhões, cobrindo jurídica, auditoria, operações, segurança das contas e gestão das reservas.
Agora, fornecedores oferecem esses processos pesados como serviços padronizados, entregando soluções plug-and-play para bancos, empresas de pagamento e marcas. Muitas vezes atuam nos bastidores, mas estão presentes em quase todo lançamento relevante de stablecoin.
Os “Foxconns” começam a surgir no setor de stablecoins.
Antes, lançar uma stablecoin exigia de um único grupo três funções: instituição financeira, provedora de tecnologia e equipe de compliance. Era preciso negociar com bancos custodiais, criar sistemas entre blockchains, superar auditorias e obter licenças em diversos países. Para a maioria, impossível de realizar.
O modelo da “fábrica OEM” solucionou esse gargalo. Uma OEM de stablecoin ajuda outras empresas a emitir, gerenciar e operar suas moedas, provendo o backend—e não marcas voltadas ao usuário.
Esses provedores cuidam desde a integração de carteiras e módulos KYC no frontend até contratos inteligentes, custódia e auditoria no backend. O cliente só determina o token e onde lançá-lo; o OEM faz o resto. Um exemplo: ao emitir PYUSD para o PayPal, a Paxos ficou responsável pelas reservas em dólar, emissão blockchain e adequação regulatória—o PayPal só adicionou a opção “stablecoin” na interface do usuário.
Três pilares de valor sustentam o modelo.
Primeiro, redução de custos. Montar sistema de stablecoin do zero custa milhões; cada etapa—licenças, tecnologia, auditorias, banco—exige recursos. OEMs padronizam operações e diminuem custos por cliente.
Segundo, agilidade. Produtos financeiros tradicionais podem levar anos para sair do papel. Um stablecoin próprio pode consumir de 12 a 18 meses. OEMs reduzem esse tempo para poucos meses. Segundo a Stably, sua API permite lançar stablecoin white-label em semanas.
Terceiro, transferência de risco. Os desafios do stablecoin não são só técnicos—they envolvem conformidade e gestão das reservas. Reguladores como OCC e NYDFS são rigorosos em custódia e compliance. Para muitos, lidar com tudo é impraticável. Por isso, a Paxos conquista clientes como PayPal e Nubank ao manter licença de trust em Nova York, gerir reservas em dólar e cumprir obrigações de transparência.
OEMs reduziram barreiras: o que era restrito a gigantes agora pode ser vendido modularmente para bancos e empresas de pagamento menores.
A Paxos definiu cedo sua rota, com foco em transformar a emissão de stablecoin em processo padronizado e comercializável—não em dominar marcas ou ganhar mercado.
Tudo começa em Nova York: em 2015, com a NYDFS liberando licenças para ativos digitais, Paxos se tornou uma das primeiras trust companies de propósito específico. Não era só simbolismo; deu à empresa poderes de custodiar fundos, operar blockchain e liquidar ativos—algo que poucas americanas conseguem.
Em 2018, a Paxos lançou USDP, estruturando cada etapa sob a vigilância regulatória: reservas em bancos, auditorias mensais e lógica de emissão/destruição on-chain. Poucos seguiram o exemplo—caro e lento—mas o resultado foi uma estrutura modular e clara para padronizar a emissão de stablecoins.
Logo, a Paxos parou de promover seu token e começou a vender módulos para terceiros.
Destaques: Binance e PayPal.
BUSD foi um projeto white-label da Binance, com branding e usuários sob controle da exchange, enquanto a Paxos cuidava da emissão, custódia e compliance. O arranjo vigorou por anos; em 2023, a NYDFS impediu novos BUSDs por falhas contra lavagem de dinheiro—expondo para muitos a relação OEM do BUSD.
Meses depois, PayPal lançou PYUSD, também emitida pela Paxos Trust Company. O PayPal tinha amplitude de usuários, mas faltava aval regulatório e não queria construir a estrutura legal do zero. Usando a Paxos, a PYUSD ganhou operação legal nos EUA—caso típico OEM.
Paxos já aplica esse modelo internacionalmente.
Em Singapura, conquistou licença “Major Payment Institution” do MAS e lançou USDG—primeira stablecoin completa fora dos EUA. Em Abu Dhabi, estabeleceu a Paxos International para lançar USDL com rendimento, usando regulamentação local para fugir da regulação americana.
A lógica multi-jurisdicional é clara: cada cliente e mercado tem regras e demandas próprias para a emissão.
Em 2024, a Paxos lançou plataforma de pagamentos com stablecoins, abriu serviços empresariais de liquidação e participou do Global Dollar Network, conectando stablecoins entre marcas e sistemas diferentes em um clearing central. O objetivo: fornecer infraestrutura total de backend.
Mas proximidade com reguladores significa fiscalização intensa. A NYDFS citou falhas na prevenção à lavagem de dinheiro no BUSD da Paxos, gerando multas e obrigações. Não foi fatal, mas mostra que a Paxos precisa seguir trilha rigorosa—cada exigência regulatória e de segurança vira parte do produto. O cliente cuida só da marca; a Paxos faz o resto. Este é o diferencial da Paxos: unir tecnologia e regulação de forma profunda.
A chegada da Bridge marca o ingresso de um gigante entre os OEMs de stablecoin.
Em fevereiro de 2025, Stripe—líder global de pagamentos, atendendo milhões de comerciantes e bilhões de dólares em transações diárias—adquiriu a Bridge. Toda a expertise da Stripe em compliance, risco e operações globais foi integrada à Bridge, migrando para o blockchain.
A Bridge foi desenhada para entregar emissão turnkey de stablecoins a empresas e instituições financeiras—não só outsourcing técnico, mas conversão de infraestrutura madura de pagamentos em serviços blockchain padronizados. Reserva, compliance e contratos ficam a cargo da Bridge; o cliente só usa a API e agrega stablecoin ao seu produto.
O case com a MetaMask ilustra isso. MetaMask, maior wallet Web3 do mundo, com mais de 30 milhões de usuários, não tem licença financeira nem expertise para reservas. Com a Bridge, lançou mUSD em meses, sem precisar construir infraestrutura de compliance e gestão financeira.
O modelo da Bridge é plataforma, não projetos sob medida. Opera como Stripe: elimina barreiras de integração para que clientes foquem no que fazem de melhor. Como apps e e-commerces um dia conectaram Stripe para cartões, agora qualquer empresa acessa stablecoins com facilidade.
A força da Bridge vem da rede global de compliance Stripe e sua base de comerciantes, dando acesso instantâneo a mercados e pipeline de clientes. Para empresas interessadas em stablecoins que não dominam blockchain ou compliance, a Bridge traz solução pronta.
Mas há limites. Como subsidiária de empresa de pagamentos tradicional, a Bridge tende a ser conservadora e menos ágil que nativas do cripto. No ecossistema de cripto, a marca Stripe não é tão reconhecida quanto no mercado tradicional.
A Bridge mira claramente clientes corporativos e financeiros tradicionais—demonstração da escolha da MetaMask por um parceiro sólido ao invés de puro fornecedor tecnológico.
O ingresso da Bridge mostra o interesse crescente de finanças tradicionais pelos OEMs de stablecoin. À medida que mais empresas do ramo participam, o setor ganha maturidade, padronização e robustez.
Fundada em 2018, em Seattle, a Stably começou emitindo sua própria stablecoin, Stably USD. Logo viu que competir com gigantes como Tether e USDC era inviável, então migrou para um nicho: permitir que outras empresas emitam suas moedas.
“Plataforma de emissão de stablecoins white-label” define sua proposta. O cliente não precisa de programadores nem especialistas em smart contract: basta chamar a API e, em semanas, lança uma stablecoin com seu nome. Blockchain, marca e identidade são escolhas do cliente; Stably entrega o backend.
Assim, Stably se distancia da Paxos. Enquanto a Paxos centraliza reservas em trusts próprios (e coleta os rendimentos), a Stably mantém reservas nos bancos dos clientes, desde que cumpram padrões mínimos.
Stably não gerencia fundos dos clientes nem faz custódia—cobra apenas pelo serviço técnico e operacional. O rendimento fica com o cliente e a Stably fatura na “taxa de serviço”.
Para muitos clientes médios, isso é fundamental. O rendimento das reservas supera muitas vezes o ganho com tokens. Ao escolher Paxos ou similares, o cliente abre mão desse lucro; com Stably, mantém os rendimentos e acelera o lançamento por menos.
Agilidade é outro ponto forte. A Stably garante launches em “menos de dois meses” e já entregou deploys em 4–6 semanas. A Paxos pode demorar muito mais. Para pilotos regionais, tempo é custo.
O perfil dos clientes é diferente. Paxos atende gigantes como PayPal e Nubank; Stably foca bancos regionais, pagamentos internacionais, carteiras Web3 e gateways de e-commerce. Não querem compliance topo de linha ou alcance mundial—buscam solução funcional para seu nicho.
Stably é multichain: suporta ETH, Polygon, BNB, Arbitrum e Base. Sempre pronta, com integração leve e replicável.
Desvantagens: Stably não tem grandes clientes de referência, nem credenciais regulatórias elevadas ou reconhecimento amplo de mercado. Seu atrativo é para clientes que valorizam retorno rápido e alto rendimento sobre compliance máxima. Bancos líderes e processadoras globais não buscam essa solução, mas há espaço no mercado médio.
O mercado acredita que potenciais emissores de stablecoin vão além dos grandes. Fora PayPal e Binance, são dezenas de bancos regionais, empresas de pagamento e plataformas B2B que não querem criar blockchains, mas precisam de stablecoins. Stably entrega o caminho rápido, barato e autossuficiente para esses players.
Se o trunfo da Paxos é compliance robusta, a Stably mostra que o mercado também pede atalhos flexíveis para lançamento rápido.
4 | Agora: Plataforma White-Label Enxuta com Apoio de Wall Street
A trajetória da Agora começa com Nick van Eck, de família ligada à VanEck, gestora global de recursos e referência em ETFs e fundos, com raízes fortes em Wall Street. Nick levou esse peso das finanças para o cripto e fundou a Agora.
No início, Agora recebeu investimento da Paradigm, VC referência em cripto e apoiadora de Coinbase, Uniswap, Blur e outros, unindo Wall Street e Silicon Valley.
A Agora quer reduzir barreiras no setor: tornar implantação de stablecoin tão simples quanto comprar um domínio. Para muitas empresas, licenças, compliance e contratos inteligentes demandam tempo e dinheiro demais. Agora resolve com plataforma white-label plug-and-play.
O cliente define moeda, marca e uso; as contas, reservas, contratos e disclosures já vêm prontas. A Agora cuida do backend; o cliente lança a stablecoin em modelo SaaS.
Enquanto a Paxos investe em compliance pesado, a Agora aposta em interface leve e padronizada—menor custo, lançamento rápido e compliance coberta no backend.
O modelo atrai: o mercado está cheio de bancos médios, empresas de pagamento regionais e até e-commerces que precisam de stablecoin mas não criam internamente. A interface da Agora permite que esses clientes acessem o serviço.
Mas o desafio é grande. Compliance regulatório ainda é obstáculo: stablecoin não é legal em todo lugar só por funcionar como registrador de domínio. Exigências regulatórias variam fortemente; a Agora terá de se adaptar caso a caso.
Além disso, ainda faltam grandes cases de clientes. Apoio de nomes como Paradigm indica potencial, mas não garante sucesso.
Enquanto Paxos, Stably e BitGo já são estabelecidas, Agora é a novata. Não busca liderança em custódia ou licenças, aposta na emissão de stablecoin como utilidade pública de interface simples. Se dará certo, o futuro dirá—mas o modelo aponta para emissão como serviço padronizado e commoditizado.
O mercado de OEMs de stablecoin ainda está nascente, mas já exibe uma tendência: à medida que a emissão se torna serviço terceirizável, abrem-se novas oportunidades além do simples lançamento de tokens.
Pagamentos internacionais são exemplo evidente. Hoje, transferências globais dependem do SWIFT—lento, caro e indisponível nos fins de semana. Bancos grandes levam dias para liquidar transações.
Stablecoins trazem solução ágil. APIs padronizadas das OEMs permitem a bancos regionais e empresas de pagamento conectar-se às rails de stablecoin e habilitar transferências instantâneas para clientes corporativos. Barreiras caem e a infraestrutura antes exclusiva dos gigantes se democratiza.
Outro uso essencial é tesouraria corporativa. Muitas empresas subestimam o impacto de uma gestão de fluxo de caixa eficiente. Ao integrar stablecoins aos pools de caixa, é possível agilizar supply chain, comércio internacional e pagamentos cotidianos.
Stablecoins viabilizam distribuição imediata de fundos entre filiais, elevam a transparência e eliminam esperas. O modelo OEM permite que bancos menores e plataformas B2B agreguem esses serviços sem criar infraestrutura própria.
O mercado evolui. Antes, stablecoins serviam só a projetos nativos de cripto. Agora, com regulação mais rígida, instituições tradicionais começam a aderir. Bancos, clearinghouses e plataformas regionais já implementam stablecoins.
Para eles, desenvolver internamente é arriscado. OEMs oferecem módulos de compliance e APIs de custódia como serviço pronto. Com a entrada dessas instituições, a escala e adoção das stablecoins podem crescer exponencialmente.
Ponto técnico central: interoperabilidade entre blockchains. Hoje, stablecoins são fragmentadas e pouco interoperáveis. Usuários enfrentam fricção—uma mesma stablecoin pode ter versões diferentes em Ethereum e BNB Chain.
OEMs trabalham para padronizar transferências e liquidação entre blockchains, facilitando movimentação de ativos. Quando resolvido, liquidez e utilidade das stablecoins atingirão novo patamar.
Modelos de negócios também vão mudar. Hoje, OEMs entregam soluções sob medida: cada cliente, uma solução. Com demanda crescente, ofertas padronizadas tipo SaaS substituirão os projetos caros. Como nuvem avançou dos modelos gerenciados ao SaaS one-click, emissão de stablecoins seguirá igual. Menos barreiras, mais clientes.
Resumindo: OEMs de stablecoin serão mais que emissores terceirizados—they vão compor a base da circulação global de valores. A corrida não é só de compliance e custódia, mas de inserir stablecoins na economia real, em escala e com eficiência.
Foxconn não desenhou o iPhone, mas foi quem viabilizou sua escala mundial. OEMs de stablecoin cumprem esse papel: operam nos bastidores e fazem o trabalho pesado para tirar stablecoin do papel.
Emitir stablecoin ficou mais difícil. Exigências regulatórias cresceram—licenças, custódia, reporting internacional, contratos, auditoria—qualquer etapa pode travar um projeto. Para a maioria das empresas, o caminho direto demanda dezenas de milhões, mais de um ano e ambiente regulatório instável. OEMs transformam barreiras em serviço.
Por isso, PayPal escolheu Paxos, MetaMask fechou com Bridge, e emersos como Agora oferecem emissão white-label. O método é o da Foxconn: desmontar complexidade em módulos escaláveis. Cliente define mercado e marca; OEM cuida do resto.
Com avanço regulatório, limites do setor ficam mais claros. O GENIUS Act dos EUA e o framework de Hong Kong levam a emissão de stablecoin para o mainstream regulatório. Regras transparentes vão acelerar demanda. Sejam empresas tokenizando dólares ou bancos lançando stablecoins locais, a próxima onda já desponta.
Essas “fábricas Foxconn” do stablecoin viram infraestrutura invisível das finanças. Dominam compliance, auditoria e ferramentas cross-chain—controlam a ponte dos ativos digitais com o mundo real. Assim como Foxconn montou a cadeia física, OEMs de stablecoin constroem a linha de produção da nova finança digital.